o navio ao mar alto é uma charrua
a abrir um rego ao coração das águas
camponeses do mar
eles semeiam
anzóis em cada dóri
e cada dóri é uma semente que germina
cada dóri sémen a olhar-se para o umbigo
cada dóri uma cadeira de tortura
cada dóri um lugar de meditação do marinheiro
e cada marinheiro um nó apertado
da rede que eles criam ao trabalho
lá vai pra o mar o Zé a largar a linha
com que arrancar do mar o peixe
mas traz pra cima só dívida externa
lá vai o Aníbal linha para o fundo
mas só o Banco Mundial mordeu o isco
e pula com força
lá vai pescar o Paulo e traz as guerras
e um chicote com pregos e a educação privada
lá vai Jerónimo e o Fundo
Monetário Internacional vem ao de cima
a respirar fora da água
lá vai o Chico e tira um tratado
que institui uma constituição para a Europa
a NATO e um fiozinho de petróleo
que ia a passar
e pronto
depois é levar tudo para o navio e laboriosamente
será o suor dos homens que salgue o bacalhau
e volta à terra porque há tempo
que o peixe está vendido
Outeiro, Eugénio Mordida s.l.: Através editora 2012 p. 57
Eugénio Outeiro (Ilha de Arousa, 1976)
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