segunda-feira, 20 de maio de 2013

IX

faina maior

o navio ao mar alto é uma charrua
a abrir um rego ao coração das águas

camponeses do mar
eles semeiam
anzóis em cada dóri
e cada dóri é uma semente que germina

cada dóri sémen a olhar-se para o umbigo

cada dóri uma cadeira de tortura

cada dóri um lugar de meditação do marinheiro

e cada marinheiro um nó apertado
da rede que eles criam ao trabalho

lá vai pra o mar o Zé a largar a linha
com que arrancar do mar o peixe
mas traz pra cima só dívida externa

lá vai o Aníbal linha para o fundo
mas só o Banco Mundial mordeu o isco
e pula com força

lá vai pescar o Paulo e traz as guerras
e um chicote com pregos e a educação privada
lá vai Jerónimo e o Fundo
Monetário Internacional vem ao de cima
a respirar fora da água

lá vai o Chico e tira um tratado
que institui uma constituição para a Europa
a NATO e um fiozinho de petróleo
que ia a passar

e pronto

depois é levar tudo para o navio e laboriosamente
será o suor dos homens que salgue o bacalhau

e volta à terra porque há tempo
que o peixe está vendido

Outeiro, Eugénio Mordida s.l.: Através editora 2012 p. 57


Eugénio Outeiro (Ilha de Arousa, 1976)

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